11 - Sustentabilidade do Suprimento de Energia Elétrica
Por que o tema é considerado de alto risco
A garantia de fornecimento seguro e contínuo de energia elétrica é essencial não só para o desenvolvimento socioeconômico, mas também para a competitividade do país. O risco de interrupções de energia tem elementos associados aos três principais segmentos do setor elétrico (geração, transmissão e distribuição) e pode comprometer serviços essenciais, afetar a atividade industrial e, consequentemente, toda a cadeia produtiva nacional.
Figura 11.1 - Três principais segmentos do setor elétrico que influenciam diretamente no suprimento de energia elétrica.
Desde a primeira edição da LAR, em 2022, persistem desafios estruturais, como a diminuição da participação das hidrelétricas na matriz energética e o aumento da presença de fontes intermitentes na geração de energia, tais como a eólica e a solar, o que aumenta a complexidade da operação do Sistema Interligado Nacional (SIN).
A crise hídrica de 2021 revelou a vulnerabilidade desse sistema, demonstrando que as medidas emergenciais adotadas no setor elétrico geraram custos da ordem de R$ 40 bilhões aos consumidores com contratação emergencial de usinas térmicas. Além disso, evidenciou a falta de um planejamento estratégico robusto para enfrentar crises energéticas vindouras.
Nos últimos dois anos, o TCU constatou que muitos riscos identificados anteriormente permanecem elevados. As interrupções prolongadas no fornecimento, agravadas por eventos climáticos extremos, subdimensionamento das redes e falta de manejo preventivo da vegetação próxima às instalações de energia, continuam sendo uma ameaça. Essas interrupções afetam diretamente setores críticos como hospitais, serviços de segurança pública e transporte, comprometendo a continuidade de serviços essenciais para mais de 200 milhões de brasileiros.
Para se ter ideia da dimensão do problema, o apagão ocorrido na região metropolitana de São Paulo em novembro de 2023 deixou 2,1 milhões de unidades consumidoras sem energia elétrica e o serviço levou sete dias para ser completamente restabelecido. Três meses antes, um blecaute havia afetado todas as regiões do Brasil, com perda de cerca de 35% da carga total de energia no país e gerou uma demora de mais de seis horas para o total restabelecimento do serviço. Em outubro de 2024, um novo apagão de grandes proporções afetou novamente a região metropolitana da cidade de São Paulo, depois de um forte temporal. Nessa ocasião, 3,1 milhões de consumidores ficaram sem energia e também foram necessários sete dias para o restabelecimento completo do serviço.
O que o TCU encontrou
Nos últimos dois anos, o TCU realizou diversas fiscalizações que resultaram na constatação de riscos à garantia do fornecimento seguro e contínuo de energia elétrica.
A ocorrência de eventos climáticos extremos tem provocado aumento das interrupções prolongadas no fornecimento de energia elétrica. No apagão de São Paulo ocorrido em novembro de 2023, os temporais resultaram na queda de árvores, danificando postes e cabos. O ocorrido em outubro de 2024, em São Paulo, se destacou por danificar quantidade importante de outros tipos de equipamentos de rede. Em ambos, houve rajadas de ventos superiores a 100 Km/h. A falta de manejo preventivo das árvores próximas às linhas de distribuição de energia contribuiu para esse resultado, além do fato de as redes elétricas não estarem dimensionadas para suportar essas condições, exigindo ações coordenadas entre agentes do setor e órgãos públicos.
As fiscalizações do TCU constataram que a falta de indicadores e metas relacionados aos objetivos da operação eletroenergética afeta a eficiência operacional, segurança e otimização de recursos. A falta de clareza sobre as decisões do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) quanto à ordem de acionamento das usinas geradoras de energia compromete a transparência do processo decisório e controle social, além de contribuir para a elevação de encargos tarifários, a depender das decisões tomadas.
Outra causa para o risco de ineficiência e ineficácia da operação eletroenergética é a ausência de plano estratégico de contingência para enfrentar situações críticas como a crise hidroenergética ocorrida em 2021. A falta de um plano para lidar com emergências compromete a capacidade de agentes do sistema elétrico agirem de forma planejada e preventiva, evitando medidas improvisadas e, por vezes, mais onerosas.
O TCU identificou que o planejamento atual do setor elétrico brasileiro, a cargo do Ministério de Minas e Energia (MME), não inclui soluções técnicas adequadas para lidar com a crescente inserção de fontes renováveis intermitentes, como solar e eólica, e com os impactos das mudanças climáticas. Tais impactos podem afetar a previsibilidade e disponibilidade de recursos hídricos, essenciais para a matriz energética do país. A falta dessas soluções compromete a capacidade de garantir a segurança energética e a eficiência do sistema a longo prazo, evidenciando falhas de governança e planejamento setorial.
O Sistema Elétrico Brasileiro (SEB) depende da energia/potência gerada por Itaipu, especialmente porque essa usina fornece energia a um custo competitivo e contribui para a estabilidade operativa do sistema nacional. Ocorre que o Paraguai, que historicamente consumia apenas uma fração da energia gerada por Itaipu, está progressivamente aumentando o consumo. Essa mudança ocorre sem que o Brasil tenha estruturado alternativas econômicas, a custos módicos, para compensar a perda no fornecimento de energia de Itaipu.
Desse modo, a indefinição quanto à revisão do Anexo C do Tratado entre Brasil e Paraguai, que trata das bases econômicas e da prestação de serviços aos dois países, pode comprometer o fornecimento e o preço da tarifa para os consumidores brasileiros. Esse tratado deveria ser renegociado em 2023, após 50 anos de vigência do tratado original, porém, falhas na coordenação entre o MME, o Ministério das Relações Exteriores (MRE) e a Casa Civil da Presidência da República têm gerado lentidão na negociação, o que pode tornar a operação do SEB mais complexa e desafiadora.
Eventos climáticos cada vez mais intensos e frequentes evidenciam as vulnerabilidades do sistema elétrico, que, sem planos de contingência eficazes, deixa a população desatendida e provoca prejuízos à economia.
O que precisa ser feito
O TCU recomendou que o Governo Federal elabore plano estratégico de contingência para o enfrentamento de situações de crises hidroenergéticas, de forma a prever medidas de gestão em situações análogas no futuro, bem como critérios para otimização dos recursos hidroenergéticos. Além disso, recomendou que elabore estudos sobre as consequências esperadas no planejamento e na operação do setor elétrico, em decorrência da transição energética e das mudanças climáticas, incluindo estratégias para adaptação a eventos extremos.
Quanto ao planejamento e à operação do setor elétrico, o TCU determinou à Aneel que regulamente a utilização de indicadores e metas e, ao CMSE, que elabore plano de ação para regulamentar procedimentos relativos à transparência das decisões sobre a ordem de acionamento de usinas geradoras de energia elétrica.
Relativamente às negociações envolvendo a disponibilidade da Hidrelétrica de Itaipu, o TCU deliberou no sentido de que o Governo Federal elabore plano de ação que contenha as atividades, cronograma, estudos necessários e responsáveis para a sua melhor preparação quanto às negociações sobre o Anexo C do Tratado de Itaipu.
Decisões recentes
Acórdãos 1.567/2022, 922/2023, 1.224/2023, 2.366/2023, 2.605/2023, 306/2024 e 2.191/2024, todos do Plenário do TCU.
Benefícios gerados pela atuação do TCU
A atuação do TCU tem trazido importantes benefícios para o setor elétrico, com deliberações que promovem melhoria da governança, transparência e segurança energética. Uma das principais contribuições do Tribunal foi a recomendação de que o Governo Federal elabore um plano estratégico de contingência para lidar com crises hidroenergéticas, como a ocorrida em 2021. Esse plano pretende listar medidas de gestão que possam ser utilizadas em futuras crises, assegurando a otimização dos recursos hidroenergéticos e a manutenção da estabilidade no fornecimento de energia.
O TCU também reforçou a necessidade de que sejam elaborados estudos sobre os efeitos da transição energética e das mudanças climáticas no planejamento e operação do setor elétrico. Com a crescente integração de fontes renováveis, como solar e eólica, o país deve desenvolver estratégias para se adaptar a essas mudanças, garantindo um sistema elétrico robusto e sustentável.
O TCU também determinou a regulamentação de indicadores e metas que mensurem o desempenho e a transparência no acionamento de usinas geradoras. Essa medida não apenas aprimora o controle sobre o sistema elétrico, mas também oferece maior clareza nas decisões, aumentando a confiança da sociedade e dos agentes do setor nas políticas públicas adotadas.
Em relação à Usina Hidrelétrica de Itaipu, o TCU deliberou que o Governo Federal elabore plano de ação para a renegociação do Tratado de Itaipu. Essa preparação é fundamental para que o Brasil defenda seus interesses energéticos de forma eficiente e se posicione adequadamente nas negociações com o Paraguai, garantindo segurança energética e benefícios tarifários para o país.