Promoção da inclusão digital
Por que o tema é considerado de alto risco
A inclusão digital é imprescindível para o desenvolvimento social e econômico do Brasil, uma vez que influencia diretamente áreas como educação, saúde e economia, além de incentivar a participação popular nas decisões do país. Em uma nação com grandes desigualdades regionais e sociais, garantir o acesso à internet e às tecnologias de comunicação a todos os brasileiros é essencial para gerar oportunidades e diminuir essas disparidades.
Nos últimos anos, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e o Ministério das Comunicações (MCom) têm buscado incluir compromissos de investimento em instrumentos regulatórios. Isso significa que, em vez de apenas recolher recursos do setor de telecomunicações, eles incentivam as operadoras de telecomunicações a investir em melhorias, como contrapartida por licenças ou como parte de acordos de ajuste de conduta.
O valor desses compromissos é significativo, envolvendo bilhões de reais. Na última licitação de frequências realizada pela Anatel, conhecida como leilão do 5G, cerca de R$ 37 bilhões foram destinados a compromissos de investimento pelas empresas vencedoras.
O tema continua sendo considerado de alto risco, pois não houve avanços substanciais na superação dos problemas identificados. A persistência de falhas na avaliação dos compromissos de investimento, na fiscalização e no alinhamento com as políticas públicas indica que os riscos associados à inclusão digital permanecem elevados. Assim, é necessário intensificar a atenção e os esforços dos órgãos competentes para reduzir esses riscos e permitir o alcance dos objetivos estabelecidos.
Ter algum tipo de acesso à internet não é suficiente
A exclusão digital continua sendo uma realidade de milhões de pessoas, especialmente em países de baixa e média renda. Essas pessoas não apenas enfrentam acesso limitado à internet, mas também carecem das condições para utilizar as tecnologias digitais de maneira plena e transformadora. Ter uma conexão básica, como acesso esporádico à internet por meio de um celular pré-pago, por exemplo, não é suficiente para que os cidadãos possam usufruir de oportunidades educacionais, econômicas e sociais.
A verdadeira inclusão digital deve ir além de oferecer uma conexão mínima. O objetivo deve ser garantir a conectividade significativa, que proporciona não apenas o acesso ocasional à internet, mas uma conexão robusta e contínua que pode transformar a vida dos cidadãos. A conectividade significativa se baseia em quatro pilares fundamentais:
- velocidade equivalente ao 4G,
- posse de smartphone,
- uso diário da internet, e
- acesso ilimitado em um local fixo (casa, trabalho, escola).
Esses pilares são essenciais para permitir que os indivíduos participem plenamente da sociedade digital. A conectividade significativa é o fator que diferencia a inclusão digital básica de uma inclusão efetiva, permitindo a participação ativa e equitativa na economia digital.
Para que as políticas públicas de inclusão digital sejam realmente eficazes, é fundamental que priorizem investimentos em infraestrutura que garantam uma conexão de alta qualidade, ao mesmo tempo em que promovem o acesso a dispositivos como smartphones. Apenas assim será possível ampliar as oportunidades educacionais, melhorar o acesso a serviços públicos e integrar maior número de pessoas à economia digital.
Figura 15.1 - Percentual de excluídos digitais por classe social e por região do país.
Figura 15.2 - Percentual de excluídos digitais por classe social e por região do país.
Nota: Considerou-se excluído digital o cidadão com até dois pontos numa escala de conectividade significativa cujo máximo é de nove pontos.
O que o TCU encontrou
Em trabalhos anteriores, o TCU analisou diversos instrumentos regulatórios no setor de telecomunicações, como o Plano Geral de Metas de Universalização (PGMU) e a elaboração de políticas públicas do setor de telecomunicações, além de editais de licitação, celebração de termo de compromisso de ajustamento de conduta (TAC) e processo sancionatório da Anatel. Com base nessa análise, o Tribunal identificou um aumento significativo na utilização de compromissos de investimento nesses instrumentos.
A Lei 9.472/1997 (Lei Geral de Telecomunicações), o Decreto 9.612/2018, a Portaria 1924/2021-MCom, assim como os regulamentos da Anatel referentes à aplicação de sanções administrativas e de celebração e acompanhamento de TAC, são exemplos de normas que regulamentam a opção pela celebração de compromissos de investimento.
Nos trabalhos mais recentes no setor de telecomunicações, como o levantamento para avaliar a política nacional de banda larga, o TCU identificou que ainda existe elevado percentual da população brasileira sem acesso à internet, o que aumenta a desigualdade social e possibilita a criação de um fosso digital entre segmentos da população.
Soma-se a isso auditoria operacional realizada pelo TCU, que constatou deficiências na fiscalização dos compromissos de investimentos assumidos pelas operadoras de telecomunicações, que nem sempre estão alinhados às políticas públicas de inclusão digital e de universalização da banda larga.
O TCU, ao analisar os compromissos de investimento na transição do regime de concessão para autorização, identificou falhas na precificação dos bens reversíveis, essenciais para calcular a compensação que a empresa deve pagar à União pelo direito de continuar a usá-los. Por isso, o Tribunal determinou que a Anatel corrigisse os cálculos, com foco nos ativos mais relevantes, como edifícios, terrenos, postes, torres, cabos de fibra óptica e equipamentos de rede. A medida destaca a necessidade de que esses ativos sejam avaliados corretamente, de acordo com o valor de mercado, como exige a legislação. A avaliação pelo valor de mercado é essencial para garantir que os compromissos de investimento assumidos pelas empresas autorizadas, protejam o interesse público de subavaliações.
Como se observa, há riscos crônicos que podem dificultar os objetivos dessa política pública. A falta de alinhamento entre os compromissos assumidos pelas operadoras de telecomunicações e as diretrizes estabelecidas nessas políticas públicas pode resultar em investimentos inadequados ou insuficientes nas regiões que mais necessitam. Além disso, deficiências na fiscalização e no acompanhamento desses compromissos pelo MCom e pela Anatel podem levar ao descumprimento de prazos e condições acordadas, comprometendo a efetividade das ações de inclusão digital.
O que precisa ser feito
Compromissos de investimento no setor de telecomunicações envolvem dezenas de bilhões de reais, mas falhas de alinhamento com políticas públicas, assim como na valoração e fiscalização desses compromissos, prejudicam a inclusão digital de milhões de brasileiros, aprofundando desigualdades sociais e econômicas.
O TCU, ao analisar diversos processos que envolveram instrumentos regulatórios, fez determinações e recomendações com o objetivo de aprimorar o processo regulatório e garantir o cumprimento dos objetivos das políticas públicas. Uma das recomendações dirigidas ao MCom é que, na alocação de recursos da política de banda larga, utilize critérios que promovam redução das desigualdades sociais e regionais.
Adicionalmente, o TCU recomendou ao MCom que a definição dos compromissos de investimento seja realizada de acordo com o planejamento estatal de médio e longo prazos, estabelecendo ações, metas, indicadores, prazos e mecanismos de monitoramento claros.
À Anatel, o TCU recomendou o aperfeiçoamento da fiscalização dos compromissos de investimento, com ênfase no cumprimento dos prazos, na sistematização dos dados de fiscalização e na publicação, em seu portal eletrônico, de informações detalhadas sobre as redes implantadas, compromissos assumidos e processos licitatórios. Essas medidas visam aumentar a transparência e promover o compartilhamento de infraestrutura entre os provedores de telecomunicações.
O TCU monitora o cumprimento dessas deliberações, a fim de verificar como os compromissos de investimento foram pactuados e como a Anatel fiscaliza e garante a implementação dessas obrigações.
Isso inclui avaliar alterações de objetivo e de cronograma, que têm reflexos sociais e econômicos sobre os valores definidos na época da licitação ou da formalização dos compromissos pelas operadoras de telecomunicações.
Outro ponto importante é a verificação dos meios utilizados pelo ente regulador para evitar a sobreposição de investimentos, considerando o nível de detalhamento dos compromissos e a diversidade dos instrumentos regulatórios.
O acompanhamento do TCU também se concentra na avaliação das políticas públicas setoriais, verificando se os objetivos estabelecidos estão sendo alcançados e se atendem ao interesse coletivo.
Decisões recentes
Acórdãos 2.032/2021, 740/2023 e 2.082/2023, todos do Plenário do TCU.
Benefícios gerados pela atuação do TCU
A atuação do TCU tem proporcionado benefícios significativos para o planejamento e a operação do setor de telecomunicações brasileiro, especialmente por meio de deliberações que promovem maior eficiência, transparência e efetividade nos gastos públicos.
No caso específico do leilão do 5G, os resultados dessa fiscalização foram especialmente relevantes. Um dos benefícios foi o aprimoramento do estudo de precificação da faixa de 26 GHz, que resultou no aumento de mais de R$ 2 bilhões no preço mínimo inicialmente calculado. Além disso, como consequência dos questionamentos feitos durante a auditoria, foi eliminada a margem adicional de 26% sobre os custos estimados para a implantação dos projetos Programa Amazônia Integrada e Sustentável (PAIS) e Rede Privativa de Comunicação da Administração Pública Federal. Essa medida reduziu em R$ 650 milhões os custos inicialmente fixados pela Anatel, permitindo que esses recursos fossem direcionados para outros compromissos previstos no leilão do 5G.
Outro destaque dessa fiscalização foi a redução de mais de R$ 44 milhões no custo previsto para o compromisso de migração da recepção do sinal por parabólicas da banda C para a banda Ku. Essa economia foi possível devido à identificação, pelo TCU, de um erro material nos cálculos.
Em resumo, as ações de controle do TCU no setor de telecomunicações têm contribuído para melhorar a governança, otimizar a utilização dos recursos e aumentar a transparência das decisões, promovendo a ampliação da inclusão digital no Brasil.