9 - Efetividade das políticas de Ciência, Tecnologia e Inovação
Por que o tema é considerado de alto risco
O desenvolvimento econômico está intrinsecamente ligado à sofisticação da estrutura produtiva de um país, onde a inovação, impulsionada por investimentos em ciência e tecnologia, desempenha papel essencial. Esses investimentos permitem que as empresas se beneficiem de manufatura avançada, aumentem a eficiência e expandam a produção de forma mais rentável. Além disso, a inovação impulsiona o crescimento de setores de alta intensidade tecnológica, como tecnologia da informação e comunicação, indústria aeronáutica e aeroespacial, indústria farmacêutica e biotecnologia, e energias renováveis.
O Brasil ocupa a 50ª posição entre 133 países no Índice Global de Inovação (IGI), segundo a Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI)1. Esse baixo desempenho é reflexo de um cenário de investimentos insuficientes: enquanto países como Israel e Coreia do Sul destinam mais de 4,7% do PIB para pesquisa e desenvolvimento (P&D), o Brasil investe apenas 1,2%. Além disso, o investimento brasileiro em educação é muito inferior à média dos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) — são cerca de US$ 3.800 por estudante do ensino fundamental e médio, comparados aos US$ 12.700 dos países desenvolvidos2. Com menos recursos para educação, o país enfrenta escassez de profissionais com as habilidades necessárias para impulsionar a inovação e apoiar a competitividade tecnológica nacional.
Gráfico 9.1 - Investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D) como percentual do Produto Interno Bruto (PIB)

Além da insuficiência de investimentos em educação e P&D, o Brasil enfrenta outros problemas persistentes na área de CTI, incluindo falta de integração entre academia e setor produtivo, e baixa participação do setor privado nos investimentos em P&D. Obstáculos como burocracia e falta de continuidade nas políticas públicas agravam essas dificuldades. A criação da Política Nacional de Inovação (PNI) e da Câmara de Inovação são passos importantes, mas é necessário corrigir falhas nesses instrumentos de governança e implementar novos mecanismos de coordenação e planejamento.
O governo brasileiro busca reverter esse quadro com iniciativas estratégicas de Ciência, Tecnologia e Inovação (CTI). Entre elas está a Nova Indústria Brasil (NIB), um programa lançado em janeiro de 2024 que visa revitalizar o setor industrial, com investimentos públicos e privados de R$ 342,7 bilhões até 20264. Também está em andamento a atualização da Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (ENCTI), com foco em integrar ciência e tecnologia às demandas de mercado e promover parcerias entre universidades, centros de pesquisa e indústria. Para 2024, o governo estima investimentos de R$ 35,97 bilhões em CTI, dos quais R$ 19,17 bilhões estão previstos no orçamento, incluindo R$ 12,73 bilhões destinados ao Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT).
O Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (SNCTI) é a base para a implementação dessas políticas, reunindo ministérios, universidades, institutos de pesquisa públicos e privados, associações de classe, agências reguladoras e o setor privado. Instituições como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) têm papel crucial no financiamento de projetos de CTI. Todos esses atores devem buscar uma abordagem colaborativa e coordenada, que alinhe esforços para enfrentar os desafios da ciência, tecnologia e inovação no Brasil e favoreça a continuidade das políticas públicas para além dos ciclos políticos.
O que o TCU encontrou
Na LAR 2022 o TCU identificou falhas na elaboração, execução e monitoramento das políticas públicas de inovação. Entre as principais deficiências estavam: falta de diagnóstico adequado na formulação da Política Nacional de Inovação (PNI); ausência de planejamento estratégico de longo prazo para uso dos recursos do FNDCT; e ineficiência na coordenação dos diversos atores envolvidos. Também foram apontadas falhas na transparência e na avaliação dos resultados, o que compromete a eficácia dos recursos aplicados.
Fiscalizações realizadas pelo TCU entre 2022 e 2024 demonstram que esses problemas persistem, reforçando a necessidade de uma abordagem sistêmica que promova a interação entre governo, academia e setor privado, dentro do SNCTI.
Com base nessas fiscalizações, o TCU identificou quatro riscos principais, com suas causas e efeitos, que afetam a efetividade das políticas públicas no SNCTI e exigem atenção por parte dos respectivos gestores e do TCU.

Falhas na elaboração, execução e monitoramento das políticas de ciência, tecnologia e inovação comprometem o desenvolvimento econômico do Brasil e reduzem sua competitividade internacional.
O que precisa ser feito
Os riscos identificados nas políticas de ciência, tecnologia e inovação (CTI) decorrem, principalmente, de deficiências na governança do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (SNCTI), da não observância dos requisitos básicos para a elaboração de políticas públicas e da falta de objetivos de longo prazo para a área de CTI no Brasil. Em resposta, o TCU emitiu recomendações e determinações com o objetivo de fortalecer a governança do SNCTI, aprimorar as políticas e estabelecer metas duradouras.
O TCU espera que os gestores de CTI concentrem seus esforços no tratamento adequado dos principais riscos que comprometem a eficiência, eficácia e efetividade das políticas de CTI. Para tanto, é necessário que o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) realizem um diagnóstico detalhado das causas e consequências dos desafios enfrentados, apoiado por dados qualitativos e quantitativos. Este diagnóstico deve servir de base para uma revisão da Política Nacional de Inovação (PNI), assegurando que as intervenções sejam fundamentadas em problemas bem definidos e em alternativas consistentes para resolvê-los.
Com esse diagnóstico, os ministérios envolvidos devem revisar a PNI para estabelecer objetivos específicos, mensuráveis e alinhados a longo prazo, além de indicadores que permitam monitorar e avaliar seu desempenho e impacto. Para implementar essa política de forma eficaz, é essencial estabelecer estruturas de governança que definam papéis, responsabilidades e os recursos necessários para cada ação, incluindo um cronograma detalhado.
No âmbito da Estratégia Brasileira para a Transformação Digital (E-Digital), a Casa Civil e o MCTI devem aprimorar as estruturas de governança e monitoramento, garantindo que a estratégia e suas ações sejam ajustadas conforme a necessidade. Essa ação requer a definição de problemas e desafios específicos, a formulação de uma teoria de intervenções bem fundamentada e o estabelecimento de indicadores que acompanhem o alcance dos objetivos tanto de curto quanto de longo prazo.
Para aumentar a transparência dos recursos destinados à CTI, a Finep ainda deve publicar informações não sigilosas sobre suas operações em seu portal de transparência, bem como manter uma execução orçamentária eficiente, evitando déficits que possam comprometer os resultados esperados.
Decisões recentes
Acórdãos 1.303/2023, 613/2024, 870/2024 e 990/2024, todos do Plenário do TCU.
Benefícios gerados pela atuação do TCU
A implementação das recomendações emitidas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) para o fortalecimento das políticas de ciência, tecnologia e inovação (CTI) pode gerar uma série de benefícios para o desenvolvimento sustentável e competitivo do Brasil. Ao promover melhorias na governança e na coordenação do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (SNCTI), as recomendações do TCU incentivam uma integração mais eficaz entre os diversos atores envolvidos, incluindo ministérios, agências de fomento, academia e setor privado. Isso reduz a duplicidade de esforços e potencializa a alocação de recursos, resultando em políticas mais eficazes e econômicas.
Outro benefício central é o aumento da eficiência na aplicação dos recursos destinados à CTI, especialmente os vinculados ao FNDCT e outras fontes de financiamento. Com maior clareza e precisão nos diagnósticos e nas definições de metas e indicadores, as políticas de CTI passam a ter ainda mais controle e transparência, o que permite o acompanhamento mais rigoroso do impacto dos investimentos. Essa medida contribui para uma melhor accountability5 e confiança pública no uso dos recursos, estimulando um ambiente favorável à inovação.
Além disso, ao estabelecer objetivos de longo prazo e monitoramento contínuo, as políticas revisadas proporcionam uma maior estabilidade para o setor, reduzindo a vulnerabilidade às mudanças de ciclo político. Essa estabilidade, aliada a uma governança sólida, incentiva o engajamento do setor privado e o desenvolvimento de parcerias estratégicas entre governo, empresas e academia, elementos essenciais para consolidar a CTI como um motor de inovação e crescimento econômico.
O TCU, ao impulsionar a transparência e a accountability, fortalece a capacidade do Brasil de responder com mais rapidez e adaptabilidade aos desafios globais de tecnologia e ciência. A maior eficácia e eficiência dessas políticas contribui para a geração de empregos qualificados, o desenvolvimento de tecnologias de ponta e o avanço da competitividade do país em mercados internacionais, além de promover melhorias concretas na qualidade de vida da população.
2 ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO. Education at a Glance 2024: OECD indicators. Paris: OECD Publishing, 2024. Disponível em: https://doi.org/10.1787/eea51596-en. Acesso em: 10 out. 2024.
3 BRASIL. Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. Dispêndios nacionais em pesquisa e desenvolvimento em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) de países selecionados. Disponível em: https://www.gov.br/mcti/pt-br/acompanhe-o-mcti/indicadores/paginas/comparacoes-internacionais/recursos-aplicados/8-1-2-dispendios-nacionais-em-pesquisa-e-desenvolvimento-em-relacao-ao-produto-interno-bruto-pib-de-paises-selecionados. Acesso em: 10 out. 2024.
4 FINANCIADORA DE ESTUDOS E PROJETOS (FINEP). Boletim do Observatório da Finep, outubro de 2024. Disponível em: http://finep.gov.br/images/a-finep/Observatorio_da_Finep/28_10_2024_Boletim_NIB_Edicao_0.pdf. Acesso em: 4 nov. 2024.
5 Termo em inglês que remete ao compromisso ético e responsável de indivíduos ou organizações em prestar contas de suas ações e decisões de forma transparente e confiável, assumindo as consequências e demonstrando dedicação aos interesses das partes envolvidas.