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19 - Integração de modais de transportes

Por que o tema é considerado de alto risco

O setor de transportes tem um papel fundamental na competitividade econômica e na qualidade de vida dos brasileiros. A intermodalidade, que consiste na integração eficiente de diferentes modais (como rodoviário, ferroviário e hidroviário), é essencial para reduzir custos e aumentar a eficiência logística, especialmente em um país com dimensões continentais.

No entanto, no Brasil, mais de 66% das cargas ainda são transportadas por rodovias, mesmo em longas distâncias, o que seria mais eficiente por outros meios, como ferrovias e hidrovias. Essa predominância rodoviária resulta em custos elevados, impactando negativamente o preço final dos produtos.

A situação é tão preocupante que, em 2022, os custos logísticos representaram cerca de 13% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, totalizando aproximadamente R$ 1,3 trilhão, quase o dobro da média de países desenvolvidos, como os Estados Unidos, onde essa proporção gira em torno de 7% do PIB, segundo a Associação Brasileira de Operadores Logísticos (Abol).

Esse cenário decorre, em grande parte, da falta de planejamento de longo prazo e da descontinuidade nos planos de transporte. Entre 2007 e 2018, o Brasil elaborou quatro planos logísticos estratégicos, que deveriam ser contínuos entre os governos. No entanto, todos foram abandonados sem produzir os benefícios esperados.

O que o TCU encontrou

Após a inclusão do tema na LAR em 2022, o TCU acompanhou a evolução do ciclo de Planejamento Integrado de Transportes (PIT) e avaliou a governança do processo de planejamento, a aplicação na seleção de projetos de infraestrutura, e se a integração multimodal norteava a priorização de projetos. Nesse processo, foram identificados três principais riscos, listados a seguir, que afetam a eficácia das ações no setor de transportes.

Riscos que ameaçam a integração de modais de transporte

O acompanhamento constatou que a responsabilidade pela decisão sobre que projetos deveriam compor a carteira de infraestrutura de transportes do Governo Federal foi dividida entre o Ministério de Portos e Aeroportos (MPor), responsável pela infraestrutura portuária, aeroportuária e hidroviária, e o Ministério dos Transportes (MT), encarregado da infraestrutura rodoviária e ferroviária. Entretanto, a reestruturação das competências entre os ministérios não preservou as estruturas de governança, fundamentais para garantir a coerência entre projetos dos diferentes modos de transporte, assegurando a intermodalidade. Isso incluiu a extinção do Comitê Interministerial de Planejamento da Infraestrutura (CIP-Infra) e do Plano Integrado de Longo Prazo da Infraestrutura (Pilpi).

Como resultado, os investimentos em transportes foram definidos sem levar em conta a interdependência entre diferentes modais, como a ligação entre uma ferrovia e um porto associado, e desconsiderando projetos mutuamente excludentes – aqueles que competem de forma predatória pelas mesmas cargas em determinados corredores logísticos. Essa falta de integração entre os modos de transporte gerou uma matriz ineficiente, empreendimentos pouco eficazes e aumento do Custo Brasil.

Além disso, o TCU identificou que o Governo Federal não comparou, de forma adequada, os custos com os benefícios sociais ao selecionar os projetos financiados com recursos públicos. Houve discordância significativa entre os projetos incluídos no novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e os planos setoriais em andamento. No caso das ferrovias, não houve previsão de recursos para projetos de alto impacto, enquanto nas rodovias, 68% dos projetos escolhidos apresentavam baixo ou médio impacto ou impacto não avaliado.

O gráfico a seguir ilustra o nível de impacto previsto no PAC para os investimentos em rodovias e ferrovias.

Gráfico 19.1 – Investimentos públicos em rodovias e ferrovias encaminhados ao novo PAC, por nível de impacto no plano setorial

Figura – Investimentos públicos em rodovias e ferrovias encaminhados ao novo PAC, por nível de impacto no plano setorial
Fonte: elaboração própria.

Adicionalmente, os produtos do ciclo de planejamento de transportes, como o Plano Nacional de Logística (PNL) 2035 e os planos setoriais, não foram usados como base para decisões sobre os projetos que deveriam ser incluídos no Plano Plurianual (PPA). Essa desconexão entre o que foi planejado e o que foi efetivamente decidido, em termos de alocação de recursos, representa uma inversão da lógica esperada para um planejamento eficaz.

A Casa Civil, em seu papel de coordenação entre os ministérios, tem responsabilidade por resolver essa falta de alinhamento, uma vez que a ausência de priorização de projetos de maior impacto e o uso inadequado do planejamento resultam em ineficiência logística e desperdício de recursos públicos. Com isso, perde-se a oportunidade de investir em projetos que poderiam ter impacto econômico e social mais significativo.

O TCU ainda encontrou problemas relacionados à transparência e à participação social no planejamento de transportes após o PNL 2035, abrangendo planos setoriais, parcerias e ações públicas. Observou-se que o MT e o MPor, com exceção do setor de aviação, não disponibilizaram informações claras sobre o andamento dos planos, nem permitiram a participação da sociedade, antes de definir os projetos prioritários. A principal causa dessa deficiência foi a realização tardia de audiências públicas e isso só ocorreu após as principais decisões sobre a carteira de projetos. Como consequência, houve redução do controle social e da legitimidade do processo decisório, além de maior risco de captura da agenda de projetos por interesses específicos.

A ineficiência da matriz de transportes, marcada pela predominância do modal rodoviário e baixa integração entre modais, faz com que os custos logísticos no Brasil cheguem a 13% do PIB, quase o dobro da média de países desenvolvidos, elevando o preço final dos produtos e prejudicando a competitividade das empresas.

O que precisa ser feito

Os projetos da carteira de investimento em infraestrutura foram decididos de forma desconexa em relação ao planejamento integrado de transportes. Diante disso, o TCU determinou que o Governo Federal apresente justificativas para cada investimento logístico incluído no novo PAC, detalhando custos, prazos, impactos, benefícios e riscos considerados no processo decisório. Além disso, o Tribunal determinou que a Casa Civil da Presidência da República reavalie os projetos enviados ao novo PAC sob a perspectiva da intermodalidade, para evitar lacunas e gargalos nos corredores logísticos.

O Tribunal também recomendou que a Casa Civil avalie procedimentos legais para incentivar o uso do planejamento logístico nas leis orçamentárias e em programas de investimentos – PPA, Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), Lei Orçamentária Anual (LOA) e PAC. Adicionalmente, recomendou a apresentação de um projeto de lei que estabeleça critérios mínimos, como análises preliminares de custo-benefício social e ambiental, para a inclusão de projetos logísticos relevantes nos orçamentos públicos, evitando, assim, obras inviáveis ou de baixa viabilidade socioeconômica.

Para melhorar o ciclo de planejamento integrado, o TCU recomendou que o MT e o MPor incluam, nos planos setoriais, além da metodologia atual de avaliação multicritério, análises de custo-benefício socioeconômico. Isso permitirá priorizar empreendimentos vantajosos, excluindo aqueles cujos custos superem os benefícios. Essa prática é comum entre os países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) e já é utilizada no Plano Aeroviário Nacional (PAN).

O TCU também recomendou a criação de uma norma para institucionalizar o ciclo de planejamento integrado de transportes. O objetivo é aumentar a transparência, promover a integração entre diferentes modais e definir corredores logísticos prioritários, oferecendo uma base sólida para a elaboração do próximo ciclo de planejamento e para a escolha de investimentos.

Decisões recentes

Acórdãos 1.472/2022 e 2.519/2023, todos do Plenário do TCU.

Benefícios gerados pela atuação do TCU

O TCU emitiu determinações e recomendações com o objetivo de fortalecer a governança no planejamento integrado de transportes. Essas ações visam a promover uma alocação mais racional de recursos públicos e privados para investimentos em infraestrutura de transportes, contribuindo para um sistema de transportes mais eficiente e, consequentemente, para a redução do Custo Brasil.

Um avanço concreto nessa área foi a edição do Decreto 12.022/2024, que instituiu o PIT e suas instâncias de governança, além de promover a abertura de consultas públicas para os planos setoriais de transportes. Esses resultados podem ser atribuídos à atuação proativa do TCU, que tem incentivado melhorias na política de transportes.

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