20 - Efetividade das concessões de rodovias e ferrovias
Por que o tema é considerado de alto risco
Entre 2022 e 2023, as concessões de rodovias federais geraram mais de R$ 16 bilhões em receitas de pedágio, de acordo com a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Esse valor foi arrecadado em um contexto de crescente fluxo de veículos, que passou de 735 milhões, em 2022, para 801 milhões, em 2023. Essas concessões têm sido cruciais para a implantação, modernização e ampliação da infraestrutura rodoviária, sem depender diretamente de recursos públicos.
O alto risco identificado decorre da necessidade de fortalecer a atuação da ANTT para torná-la mais ágil e eficiente, além de aprimorar o planejamento estratégico do programa de concessões de rodovias federais. A expansão progressiva da desestatização dessas infraestruturas exige uma atuação eficaz da agência reguladora para garantir o cumprimento dos objetivos de melhoria e desenvolvimento da infraestrutura nos próximos anos.
Tabela 20.1 - Comparativo de qualidade e investimentos em infraestrutura rodoviária sob gestão pública e privada

Apesar de avanços registrados no planejamento, na regulação e no acompanhamento contratual, muitas melhorias previstas nos contratos ainda não foram implementadas. Isso mantém o tema em uma zona de risco elevado, apesar de inovações promissoras.
No setor ferroviário, problemas recorrentes no transporte de cargas, tais como descumprimento de investimentos obrigatórios e abandono de trechos de ferrovias, comprometem a eficiência e sustentabilidade na prestação dos serviços. A infraestrutura ferroviária, embora extensa (29.022 km), tem baixa densidade e conectividade em relação a outros países com grandes malhas, como os EUA e a China. Essa limitação dificulta a integração e o uso compartilhado entre diferentes operadores, agravando o desafio de cobertura nacional.
Tabela 20.2 - Situação da malha ferroviária no Brasil

Além disso, aproximadamente 64% da malha ferroviária está subutilizada, assim considerados os trechos com ociosidade acima de 70%. Soma-se a isso o fato de que a velocidade média de operação é de apenas 16 km/h, o que impede a movimentação eficiente de cargas sensíveis a tempo, como insumos industriais[1].
O que o TCU encontrou
Auditoria do TCU revelou, no quadro 20.1, que a inadequada estruturação do Programa de Concessões Rodoviárias Federais (Procrofe) e o acompanhamento insuficiente dos contratos de concessão pela ANTT comprometem o cumprimento das obrigações contratuais pelas concessionárias. Esse cenário pode resultar em rodovias concedidas que não oferecem capacidade e qualidade adequadas ao conforto e à segurança dos usuários, além de aumentar os custos de transporte, prejudicando os usuários.
O Ministério dos Transportes (MT) tem feito progressos no desenvolvimento do Procrofe, mas precisa avançar. Um passo importante foi a criação de indicadores que permitem avaliar anualmente a contribuição das concessões para os objetivos da Política Nacional de Transportes.
Durante monitoramento, foi observado, ainda, progresso no campo regulatório, com a emissão de novos regulamentos para concessões rodoviárias e melhorias na estruturação da ANTT para a gestão dos contratos de concessão de rodovias. No entanto, em vários contratos de concessão as melhorias previstas ainda não são executadas.
A ANTT tem investido na modernização dos sistemas de fiscalização, incorporando tecnologias da informação. Apesar disso, esses sistemas ainda estão em fase de implementação, com previsão de conclusão para janeiro de 2026. Paralelamente, foram identificados avanços no tratamento de riscos por meio do aperfeiçoamento de regras contratuais dos novos trechos concedidos, o que gera expectativa de melhor cumprimento das obrigações estipuladas.
No setor ferroviário, o cenário é ainda mais preocupante. A fiscalização da ANTT tem sido prejudicada pela falta de metodologias adequadas e pelo subaproveitamento das informações fornecidas nos Relatórios de Acompanhamento Anual (RAA), que não oferecem dados gerenciais robustos sobre a manutenção e conservação da infraestrutura, nem sobre o acompanhamento dos investimentos obrigatórios. Além disso, as regras de dispersão tarifária falham em garantir tratamento isonômico aos usuários, agravando as desigualdades no setor. A ausência de indicadores estruturados torna difícil avaliar a efetividade da fiscalização, o que compromete a capacidade da ANTT de corrigir falhas e garantir a execução correta dos contratos.

Deficiências na gestão e fiscalização das concessões de rodovias e ferrovias prejudicam a implementação de obras e serviços previstos nos contratos, elevam os custos para usuários devido à ineficiência operacional e comprometem a segurança por falta de manutenção adequada.
O que precisa ser feito
O TCU destacou a necessidade de que os órgãos responsáveis desenvolvam um planejamento estratégico para as concessões de rodovias, com ferramentas de governança e gestão que permitam a avaliação eficaz de diretrizes, objetivos e metas estabelecidos. Também recomendou à ANTT que reavalie seus mecanismos regulatórios e administrativos para garantir a execução tempestiva das obras de ampliação das rodovias concedidas.
No setor ferroviário, o TCU recomendou o fortalecimento da área de regulação, com o objetivo de aprimorar o conjunto de normas, incluindo regulamentações específicas sobre a faixa de domínio e a prestação de serviço adequado. Além disso, destacou a necessidade de modernizar a fiscalização ferroviária, por meio da adoção de soluções tecnológicas que permitam o registro digital das informações diretamente em campo, bem como da otimização dos métodos e procedimentos de fiscalização da ANTT.
O Tribunal recomendou a padronização dos novos RAA entregues pelas concessionárias, de modo que a ANTT possa gerar informações gerenciais mais úteis sobre o estado e a evolução da malha ferroviária, especialmente no que se refere à infraestrutura. Também orientou que a ANTT exerça sua prerrogativa de alterar o conteúdo e o formato dos RAA conforme a necessidade, melhorando a qualidade das informações recebidas.
Em complemento, foi recomendada a inclusão de indicadores no planejamento estratégico da agência, de forma a poder acompanhar a adequação da infraestrutura ferroviária e a qualidade da prestação dos serviços de transporte de cargas. O Tribunal também sugeriu a elaboração de planos anuais de gestão e fiscalização para medir os resultados esperados das atividades de fiscalização ferroviária.
O TCU recomendou, ainda, o fortalecimento dos mecanismos regulatórios e fiscalizatórios da ANTT, a fim de garantir que as concessionárias cumpram os investimentos obrigatórios dentro dos prazos estabelecidos nos contratos de concessão. Por fim, o Tribunal propôs o aperfeiçoamento da cláusula contratual referente ao limite de dispersão tarifária em futuros contratos, permitindo uma fiscalização mais assertiva e evitando o tratamento não isonômico dos usuários dos serviços ferroviários.
Decisões recentes
Benefícios gerados pela atuação do TCU
O monitoramento do cumprimento das determinações e recomendações emitidas nos Acórdãos 2.190/2019 e 601/2023, ambos do Plenário do TCU, tem evidenciado iniciativas por parte do MT e da ANTT para dotar o programa de concessões de rodovias federais de normas robustas, bem como de ferramentas eficazes de planejamento, acompanhamento, gestão e fiscalização contratual. Essas medidas permitirão às concessionárias cumprir suas obrigações contratuais e reduzir os níveis de inexecução das principais melhorias previstas.
Em relação às concessões de transporte ferroviário, deve haver um aprimoramento mais abrangente da fiscalização exercida pela ANTT, com o objetivo de incentivar as concessionárias a elevar a qualidade do serviço e a garantir a manutenção e expansão da malha ferroviária. Essas iniciativas também reforçam a responsabilização das concessionárias em casos de condutas incompatíveis com a legislação vigente e os contratos de concessão.
A melhoria na gestão dos dados de fiscalização ainda deve impactar positivamente a regulamentação das metodologias e dos temas sujeitos à fiscalização, aprimorando a eficácia do processo fiscalizatório e proporcionando maior segurança e eficiência no setor ferroviário.