Governança territorial e fundiária
O que o TCU encontrou
O Tribunal de Contas da União (TCU) detectou deficiências no conhecimento da malha fundiária nacional e na governança de solos não urbanos. Destaca-se a falta de definição, pelo Estado brasileiro, de prioridades para ocupação e uso do solo e promoção da sustentabilidade do uso do solo e da água. Os principais problemas referem-se a:
- formalização de lógica de intervenção governamental aderente aos problemas diagnosticados, em relação ao solo e à água;
- planejamento integrado para políticas públicas de regulação da ocupação do solo e sustentabilidade dos recursos do solo e da água;
- avaliação e monitoramento interinstitucional das políticas públicas de regulação da ocupação e do uso do solo e sustentabilidade do uso do solo e da água;
- articulação das diversas instituições responsáveis pela coleta e pelo armazenamento de dados, bem como geração de informações georreferenciadas sobre a situação fundiária do país – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Ministério do Meio Ambiente (MMA), Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB) e outros;
- organização, sistematização e operacionalidade de dados decorrentes de levantamento de solos do Brasil; e
- levantamento e integração dos sistemas cadastrais rurais utilizados na Administração Pública.
As falhas na definição de prioridades para ocupação e uso do solo e ações de promoção da sustentabilidade do uso do solo e da água perpassam a dispersão e falta de integração entre instituições governamentais responsáveis e complexidade e fragmentação da legislação correlata. Como consequência, o Brasil possui pouco conhecimento, tanto sobre ocupação do território quanto sobre capacidade de uso dos solos.
O TCU identificou, ainda, deficiências na execução da política de regularização fundiária das áreas rurais da Amazônia Legal, com problemas relacionados a não reversão de áreas irregularmente ocupadas – representam, cerca de, R$ 2,4 bilhões; incremento do desmatamento – 82 mil hectares desmatados apenas nas regiões vistoriadas; inconsistências e sobreposições nos sistemas georreferenciados – Sistema de Gestão Fundiária (Sigef) e Sistema Nacional de Gestão de Informações Territoriais (Sinter); indícios de titulações irregulares – referentes a imóveis avaliados em, cerca de, R$ 12,3 milhões; entre outros.
Foram encontrados, também, indícios de irregularidades na seleção de beneficiários do Programa Nacional de Reforma Agrária (PNRA) decorrentes de falhas no processo de seleção e na supervisão ocupacional, com prejuízos financeiros potenciais de R$ 2,83 bilhões (R$ 89,3 milhões no curto prazo). Esses indícios revelam baixa adoção de medidas que mitigam ocorrências relacionadas à ocupação irregular dos lotes, com impactos negativos para a boa gestão da ocupação e do uso do solo e sustentabilidade do uso do solo e da água.
Por que é considerado alto risco para a Administração federal
O desconhecimento da malha fundiária nacional impede a boa gestão das terras públicas e execução de diversas políticas públicas com componente territorial, impactando o gasto público e exercício de direitos de inúmeras pessoas.
Em 2014, foi gasto, aproximadamente, R$ 1,7 bilhão em políticas e instrumentos públicos relacionados à governança de solos não urbanos. Nos próximos 25 anos, a degradação da terra pode reduzir a produtividade global de alimentos em até 12%, levando ao aumento de 30% nos preços dos alimentos, em nível mundial. Esse risco impacta o setor agropecuário, que é relevante na economia brasileira. Em 2020, a participação do setor agropecuário no produto interno bruto (PIB) brasileiro foi de 26,6%, podendo chegar a 28%, em 2021, segundo estudo divulgado pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), da Universidade de São Paulo (USP). Em 2021, o valor bruto da produção agropecuária (VBP) atingiu R$ 1,129 trilhão.
O que precisa ser feito
O Tribunal recomendou à Presidência da República (PR) a revisão geral e consolidação dos dispositivos legais que tratam da organização do território e acesso aos recursos fundiários, inclusive no que se refere à articulação com os demais entes, para desenvolvimento de planejamento nacional.
Também recomendou à PR e ao atual Ministério da Economia (ME) a regulamentação do mapeamento e da integração dos sistemas de informação geoespaciais e articulação com as diversas instituições envolvidas, com vistas à constituição de rotinas de limpeza e conferência das informações fundiárias georreferenciadas, para disponibilização em dados abertos.
No que diz respeito à política de regularização fundiária das áreas rurais da Amazônia Legal, determinou ao Incra a adoção de medidas, com vistas à recuperação dos imóveis da União irregularmente ocupados, à fiscalização do comércio ilegal e ao combate à grilagem de terras federais.
Em complemento, determinou ao Mapa o estabelecimento de metas de georreferenciamento, titulação, vistorias e projeção de tempo, para cumprimento dos objetivos do programa, além da instituição de controles internos, para prevenção e identificação de irregularidades e fraudes.
Quanto ao PNRA, o TCU determinou: a apuração de todos os indícios de irregularidades na seleção de beneficiários; a adoção de medidas, para respeito aos princípios da publicidade, isonomia e objetividade de critérios, na gestão desses processos; o aprimoramento do Sistema de Informações de Projetos de Reforma Agrária (Sipra); o efetivo exercício da supervisão ocupacional dos lotes da reforma agrária; e o desenvolvimento de indicadores gerenciais e de desempenho, para avaliação periódica dos resultados da política.
Em complemento, recomendou ao Mapa, ao Incra, ao ME e à Casa Civil da PR a manutenção de entendimentos, com vistas a proporcionar ao Incra condições necessárias e suficientes à execução de suas competências.
Decisões recentes
Acórdãos 145/2010, 450/2014, 1.745/2015, 1.942/2015, 775/2016, 2.451/2016, 1.976/2017, 2.115/2017, 313/2018, 1.928/2019, 3.155/2019, 677/2020, 727/2020, 1.840/2020 e 2.406/2021, todos do Plenário do TCU.