O TCU e o

Desenvolvimento Nacional

Contribuições para a administração pública

Assistência Social

O combate à pobreza é a missão primeira da Assistência Social e uma questão urgente em um país onde 12 milhões de pessoas (5,7% da população) vivem na pobreza extrema, com menos de R$ 155,00 mensais, e 51 milhões (24,1% da população) vivem com até R$ 450,00, 43% do salário-mínimo, e, portanto, abaixo da linha de pobreza (Síntese de Indicadores Sociais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, 2021, p. 60)).

A pobreza anda de mãos dadas com a desigualdade social, afetando de forma diferente diversos grupos populacionais. O Nordeste, que responde por 27,1% da população brasileira, contém 45,5% dos brasileiros pobres. Entre os pretos e pardos, 31% são pobres, contra 15,1% entre os brancos. Seguindo a tendência internacional, a pobreza atinge com mais força as crianças e adolescentes, 38,6% da população entre 0 e 14 anos estão abaixo da linha de pobreza, contra apenas 8,8% da população acima de 60 anos. (IBGE 2021, pp. 63,66)

A pobreza compromete, em vários aspectos, o desenvolvimento nacional, ao excluir da economia um amplo contingente de pessoas e dificultar a geração de riqueza suficiente para o crescimento do conjunto da sociedade. E não é um problema apenas do Brasil. O tema é destaque na agenda internacional, constando dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) e dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), com metas de redução a serem perseguidas por todos os países.

A Assistência Social é reconhecida constitucionalmente como direito do cidadão e dever do Estado. Os estados e municípios são encarregados das atividades de prestação direta dos serviços socioassistenciais, por meio de equipamentos como os Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) e Centros de Referência Especializados de Assistência Social (CREAS), enquanto que à União compete regular tais atividades, financiar e criar instrumentos de incentivo para o bom funcionamento do sistema de assistência social e financiar os principais programas de transferência de renda, como, por exemplo, o Auxílio Brasil e o BPC.

O Tribunal, preocupado com a sustentabilidade dos programas assistenciais, vem acompanhando o crescimento da despesa e a reduzida capacidade de emancipação das famílias em relação aos programas de transferência de renda.

As despesas com o PBF/Auxílio Brasil aumentaram de R$ 3,79 bilhões, em 2004, para R$ 89,1 bilhões, em 2022 (orçamento aprovado para o Auxílio Brasil), em razão não só da inclusão de novas famílias beneficiárias no programa, mas também do aumento dos valores médios transferidos. Em 2004, havia 6,5 milhões de famílias recebendo o benefício médio de R$ 65,69 (PBF), passando, em 2022, para 18 milhões auferindo valor médio mensal de R$ 403,08(Auxílio Brasil). O BPC atendeu 2,16 milhões de idosos e 2,58 milhões de pessoas com deficiência, em dezembro de 2021, com um dispêndio total de R$ 63 bilhões naquele ano. Somando-se os dois programas, são quase 23 milhões de pessoas ou famílias alcançadas.

Pela importância social e materialidade que detêm (orçamento previsto para 2022 em torno de R$ 160 bilhões), são objeto de acompanhamento sistemático pelo TCU, desde 2015, e eventuais erros e indícios de fraudes identificados são comunicados ao órgão gestor, para apuração e providências, que incluem o cancelamento do benefício e a recupe-ração de valores pagos indevidamente.

Outra abordagem do TCU sobre esse assunto procura avaliar possíveis deficiências na gestão desses benefícios, cuja parte importante do processo de concessão está sob responsabilidade de terceiros externos ao Ministério da Cidadania: INSS e Secretaria de Previdência, no caso do BPC, e municípios e DF, no caso do Auxílio Brasil. Assim, oTCU tem identificado problemas de tempestividade em ambos os casos: aumento do tempo médio de concessão de 78 dias em 2015 para 311 dias em 2020, para o BPC de pessoas com deficiência, e fila de 1,66 milhões de famílias no Bolsa Família em abril de 2020.

Após os programas de transferência de renda, a segunda maior atuação da Assistência Social está na prestação de serviços socioassistenciais por meio do Sistema Único de Assistência Social (a rede SUAS). Conforme Relatório de Gestão de 2020, o Ministério da Cidadania cofinanciou o funcionamento de 7,45 mil CRAS, o que corresponde a 88% das 8,4 mil unidades existentes no país.

A cobertura de atendimento atingiu 25,7 milhões de famílias, em 5,5 mil municípios. São atendidas famílias e indivíduos ameaçados de violação de direitos (proteção social básica) e vítimas de violência física, sexual, negligência, abandono e maus tratos (proteção social especial). Os valores destinados no orçamento de 2020 para o SUAS foram de quase R$ 2,5 bilhões, na esfera federal, repassados, em sua maioria via transferência fundo a fundo, a estados e municípios.

Além disso, outro desafio crucial decorre do fato de que o cadastramento do CadÚnico, utilizado para concessão dos benefícios do PBF e BPC, é feito pelas secretarias municipais e a renda a ser utilizada no cálculo é autodeclarada, existindo grande risco de fraudes e erros nas bases dos programas.

Por Fiscalizações realizadas pelo Tribunal em 2014 detectaram deficiências nos controles e processos de prestação de contas das transferências fundo a fundo, riscos de desvios e baixo índice de eficiência das ações desenvolvidas. Somente 5,9% dos CRAS e 8,7% dos CREAS eram eficientes.

Destacam-se, ainda, três importantes linhas de atuação da assistência, que são a inclusão produtiva do público-alvo dos programas assistenciais; segurança alimentar e nutricional, orientada para a inclusão socioprodutiva rural; e atenção à primeira infância, que vem ganhando, recentemente, mais visibilidade. São ações que têm o objetivo de garantir a dignidade do cidadão, a sustentabilidade dos programas e a quebra do ciclo de pobreza. Por meio da oferta de oportunidades e empregabilidade para as famílias mais pobres, busca-se incentivar a emancipação dos beneficiários dos programas de transferência de renda. Tem-se anunciado o acréscimo de investimento na primeira infância, com foco no desenvolvimento das crianças desde pequenas e na redução de pobreza nessa faixa etária. No conjunto, são ações que visam a quebrar o ciclo intergeracional da pobreza e proporcionar a chamada “porta de saída”.

Por fim, cabe destacar dois pontos importantes para o tema. O primeiro aponta para a necessidade de desenvolvimento, pelo governo brasileiro, seguindo as tendências internacionais, de novos indicadores de mensuração de pobreza, de caráter multidimensional, a fim de aprimorar o desenho de futuros programas sociais e as aferições dos resultados alcançados pelos atuais programas sobre a pobreza.

O segundo refere-se ao aprimoramento do Cadastro Único de Benefícios Sociais: utilizado para concessão dos benefícios do PBF e BPC, tal cadastro é realizado pelas secretarias municipais de modo auto declaratório. Significa que a renda utilizada no cálculo dos benefícios é informada pelo beneficiário, sem outra forma de aferição, com grande risco de fraudes e erros nas bases dos programas. Com efeito, o acompanhamento realizado pelo TCU sobre o auxílio emergencial identificou indícios de concessão indevida a 8,2 milhões de pessoas e 6,5 milhões de mulheres provedoras de famílias monoparentais, decorrentes, em grande parte, da insuficiência de controles sobre critérios legais referentes à composição familiar, no cadastro de benefícios assistenciais.


Propostas

  • Identificar ações e indicadores que possam auxiliar e incentivar a emancipação dos beneficiários do PBF (Acórdão 2.382/2014-TCU-Plenário, relator Min. Augusto Sherman).
  • Incentivar os CRAS e CREAS a buscarem maior eficiência de atuação (Acórdão 2.382/2014-TCU-Plenário, relator Min. Augusto Sherman).
  • Aprimorar os controles sobre os benefícios concedidos do PBF, principalmente os relativos aos dados de registros dos indivíduos e critérios de elegibilidade do programa (Acórdão 1.009/2016-TCU-Plenário, relator Min. Weder de Oliveira).
  • Aperfeiçoar o processo de prestação de contas dos recursos de assistência social transferidos fundo a fundo para estados e municípios (Acórdão 310/2015-TCU-Plenário, relator Min. Augusto Sherman).
  • Revisar e aprimorar as fontes de informação associadas e o desenho dos principais indicadores da função Assistência Social (Acórdão 1.254/2014-TCU-Plenário, relator Ministro Augusto Sherman).
  • Aperfeiçoar os macroprocessos realizados pela Secretaria Nacional de Assistência Social (SNAS), em especial os relativos ao controle dos CRAS e ao BPC (Acórdão 362/2014-TCU-Plenário, relator Min. Augusto Sherman).
  • Implantar o sistema integrado de dados de que trata o art. 12 da Emenda Constitucional 103/2019 e mitigar fragilidades nos critérios de autodeclaração de composição familiar, ende-reços e renda, para recebimento de benefícios assistenciais, de modo a reduzir os pagamentos indevidos. Em complemento, instituir medidas de recuperação desses pagamentos (Acórdão 3.142/2021-TCU-Plenário, relator Min. Bruno Dantas).
  • Referente ao BPC: apresentar avaliação financeira e atuarial dessas despesas, com vistas a garantir a sua transparência e sustentabilidade; aperfeiçoar procedimentos administrativos, avaliações sociais e perícias médicas, de modo a tornar a análise das requisições mais ágil, racional e econômica e, por conseguinte, reduzir o tempo de espera dos solicitantes e a quantidade de ações judiciais. (Acórdãos 1.435/2020 e 2.298/2020-TCU-Plenário, relator Min. Marcos Bemquerer Costa).
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