AUDITORIA OPERACIONAL DE ECONOMICIDADE E EFICIÊNCIA DO PROGRAMA AUXÍLIO BRASIL

Contextualização

Segundo o Observatório das Metrópoles, mais de 3,80 milhões de habitantes das regiões metropolitanas brasileiras entraram em situação de pobreza no período de 2020 a 2021 em uma soma que chega a 19,8 milhões de pessoas. Os números impressionam, isto porque representam 23,7% da população metropolitana e correspondem a um aumento de 7,20 milhões de pessoas em relação a 2014, quando essa parcela representava 16,0% da população.

Nesse contexto, foi instituído o então Programa Auxílio Brasil (PAB), pela Lei 14.284, de 29 de dezembro de 2021, criado para ser um programa integrador de várias políticas públicas de assistência social, saúde, educação, emprego e renda, em substituição ao Programa Bolsa Família. Sua criação tornou oportuna a avaliação do novo programa sob a ótica comparativa com o Bolsa Família, programa que o precedeu, apontando avanços e retrocessos trazidos pelas mudanças de valores, bem como quanto às novas parcelas criadas. Sua regulamentação se deu pelo Decreto 10.852/2021.

À época da fiscalização, o PAB era o principal programa de transferência de renda no país, sendo instrumento de garantia de renda no novo cenário de pobreza e carestia que adveio da crise da Covid19. Após a edição da Medida Provisória 1.164, de 2/3/2023, foi instituído o Programa Bolsa Família, em substituição ao Programa Auxílio Brasil.

Oficialmente, conforme constava no sítio do programa na web, o PAB tinha natureza social de transferência direta e indireta de renda destinada às famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o país. Além de garantir uma renda básica a essas famílias, o programa buscava simplificar a cesta de benefícios e estimular a emancipação dessas famílias para que alcançassem autonomia e superem situações de vulnerabilidade social.

A legislação do PAB promoveu atualização das linhas de pobreza utilizadas nas políticas públicas nacionais. Assim, o reconhecimento dos pobres e extremamente pobres passou a ser realizado considerando rendas até, respectivamente, de R$ 200,00 e R$ 100,00, segundo o art. 18 do Decreto 5.209/2004, para rendas até R$ 210,00 e R$ 105,00 conforme consta no art. 4º, § 1º, da Lei 14.284/2021.

Estruturação da governança e gestão

O Programa Auxílio Brasil (PAB) teve sua gestão realizada de forma compartilhada. Assim, tanto a União, quanto os Estados, o Distrito Federal e os Municípios tinham deveres em sua execução. Esses entes federados tinham a responsabilidade de ofertar serviços de saúde, educação e assistência social ao público-alvo do PAB.

No nível federal, competia ao Ministério da Cidadania a coordenação, gestão e operacionalização do PAB. Também, esse Ministério era responsável por estabelecer os mecanismos de funcionamento do Índice de Gestão Descentralizada (IGD) do PAB e do Cadastro Único. O art. 2º do Decreto 10.852/2021 estatuiu de forma exaustiva a competência daquela pasta ministerial.

Aos demais entes federados, nos termos do Decreto 10.852/2021, cabia a execução e a gestão do PAB mediante a conjugação de esforços, observando: a intersetorialidade, a participação comunitária, o controle social e a articulação em rede. As competências dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios na execução e na gestão do PAB são definidas nos art. 15 a 17 do citado Decreto.

Ainda em relação às competências a cargo do Ministério da Cidadania, havia uma desconcentração das atividades em termos de secretarias e departamento, remetendo a cada órgão a responsabilidade pela implementação e execução de cada benefício do PAB.

O QUE O TCU FISCALIZOU

O TCU realizou auditoria operacional no então Programa Auxílio Brasil (PAB), principal programa nacional de transferência de renda e substituto do Programa Bolsa Família (PBF). Após a edição da Medida Provisória 1.164, de 2/3/2023, foi instituído o Programa Bolsa Família, em substituição ao Programa Auxílio Brasil.

O então PAB foi avaliado quanto à equidade per capita resultante dos benefícios percebidos, ao custo-efetividade, em termos de redução da pobreza, à adequada focalização ao seu público-alvo e à implementação dos novos benefícios.

Volume de recursos fiscalizados

R$ 113 bilhões

O QUE O TCU ENCONTROU

Em relação ao programa anterior (Programa Bolsa Família - PBF), o PAB modificou o desenho da política pública, ao inserir pagamentos por família: o benefício extraordinário (R$ 400,00, valor mínimo) e o complementar (mais R$ 200,00), prejudicando a equidade per capita entre as famílias, pois os mesmos R$ 600,00 pagos pelo PAB, atualmente, atendem diferentes famílias pelo mesmo valor, independentemente do número de membros.

Com a adoção do benefício extraordinário e, posteriormente, do benefício complementar, a equidade de recebimento de valores per capita entre as famílias beneficiárias do PAB reduziu-se comparada à do PBF e à do próprio PAB antes desses benefícios. Esse novo desenho do programa prejudicou o cumprimento dos seus objetivos e gerou incentivos para que as famílias se cadastrem separadamente, comprometendo, também, a qualidade do CadÚnico.

Como padrão de comparação do desenho de transferência de renda do PAB, utilizou-se o desenho do PBF, já bastante conhecido e estudado por este Tribunal e pela sociedade. Considerando que a última alteração no desenho do PAB aconteceu em agosto de 2022, com a inclusão do benefício complementar, este foi o mês escolhido para basear as comparações dos diferentes desenhos de transferência de renda.

A partir da lista de beneficiários de agosto de 2022, foi recalculado quanto seriam seus benefícios se o Programa Bolsa Família ainda estivesse em vigor àquela época e, posteriormente, calculado o valor do benefício per capita médio por classe de número de membros na família. Esse mesmo cálculo foi realizado para o PAB com o desenho inicialmente aprovado, os benefícios denominados nesta auditoria como “cesta raiz”; para o PAB com o benefício extraordinário; e para o PAB com os benefícios extraordinário e complementar, que era o desenho em vigor em agosto de 2022. Os resultados são apresentados no gráfico abaixo.

Gráfico: Valor do benefício per capita por número de pessoas na família e desenho do programa.

Gráfico: Valor do benefício per capita por número de pessoas na família e desenho do programa.

Fonte: TCU, a partir de dados da Folha de Pagamentos do PAB e Cadastro Único.

Ao se analisar o gráfico, deve-se ter em mente a representatividade de cada uma das classes de número de famílias. Em agosto de 2022, havia 4,92 milhões de famílias unipessoais (24,4% do total), 5,35 milhões de famílias com duas pessoas (26,5%), 5,03 milhões de famílias com três pessoas (24,9%), 2,92 milhões de famílias com quatro pessoas (14,5%), 1,02 milhões de famílias com cinco pessoas (6,0%), e 0,747 mil famílias com seis ou mais pessoas (3,7%).

Em decorrência da inadequação do desenho do então PAB, os custos para a redução da pobreza eram superiores aos do PBF e aos do próprio PAB “cesta raiz”, antes dos benefícios extraordinário e complementar. Considerando o desenho do PAB “cesta raiz”, o PAB atual poderia economizar 17,8% de seu orçamento, mantendo o mesmo impacto no combate à pobreza, ou reduzir a pobreza 15,2% a mais, com o mesmo orçamento gasto, o que demonstra ineficiência do desenho do PAB atual.

Estimativas de público-alvo baseadas na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC) revelaram um problema de focalização no PAB, com possível inclusão indevida de 3,5 milhões de famílias a mais, em outubro de 2022.

A qualidade do CadÚnico, que subsidia o PAB e outros programas sociais, decaiu significativamente, desde a pandemia de covid-19, com a suspensão de revisões e averiguações internas na base de dados e o afastamento social das equipes municipais de cadastramento das famílias. A precarização da gestão do CadÚnico, aliada à inadequação do desenho do atual PAB, acarretou a fragmentação cadastral das famílias, visando auferir maiores rendimentos ao programa. A maior evidência é a duplicação da quantidade de famílias unipessoais beneficiárias desde 2020.

Dos cinco novos benefícios de caráter emancipatório, dois deles, o Auxílio Criança Cidadã e o Auxílio Inclusão Produtiva Urbana, não foram implantados por razões normativas e administrativas.

O que precisa ser feito

Pelo Acórdão nº 2725/2022 - TCU - Plenário, foi recomendada a readequação do desenho do programa; a investigação dos seus problemas de focalização, sobretudo os prováveis erros de inclusão; a regularização da gestão da qualidade de dados do CadÚnico; a correção de planejamento, visando à implementação dos benefícios pendentes.

Quais os próximos passos

Monitoramento das recomendações do Tribunal.

Dados técnicos

Relator TC Unidade Responsável Acórdão
Min. Subst. Augusto Sherman 007.871/2022-8 AudBenefícios/
SecexContas
2.725/2022-TCU-PL
Sessão de 7/12/2022
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