Governo Digital
Estratégia Brasileira para a Transformação Digital (e-Digital)
Segundo o Índice de Competitividade Mundial, do International Institute for Management Development (IMD), que teve a participação de 64 países, o Brasil foi classificado na 57ª posição, e, sobre os quatro 4 pilares avaliados (desempenho econômico, eficiência do governo, eficiência dos negócios e infraestrutura), o país encontra-se no que poderíamos chamar de “zona de rebaixamento”, entre as quatro últimas colocações no ranking, justamente nas dimensões relacionadas à eficiência do governo e à dos negócios.
Em 2020, segundo o Índice de Governo Digital (EGDI) das Nações Unidas, o Brasil encontrava-se na 54ª posição, entre os 192 países avaliados. Éramos o 20º mais avançado na digitalização de serviços (OSI), mas estávamos estagnados na 68ª posição, na dimensão de capital humano (HCI), e nossa colocação em infraestrutura (TII) piorava ano após ano – de 58º, em 2016, para 68º, em 2018, e 72º, em 2020. Isso demostra que outras nações têm avançado em velocidade superior à nossa.
A atenção que o TCU dispensa ao tema, dada a relevância estratégica e viabilizadora para o desenvolvimento econômico sustentável da nação, tem produzido marcos estruturantes para o país, a exemplo dos recentes Acórdãos 3.145/2020 (Plataforma de cidadania digital), 1.480/2021 (Internet das coisas), 1.784/2021 (Governança das ações de transformação digital), 2.032/2021 (Licitação de frequências do padrão 5G), 2.279/2021 (Plataforma de compartilhamento de dados – Conecta), 1.139/2022 (Inteligência Artificial) e 1.384/2022 (Lei Geral de Proteção de Dados), todos do Plenário.
Programa Brasil Moderniza
O programa Brasil Moderniza busca aumentar a qualidade da prestação de serviços à sociedade, atualizando o ambiente de negócios e a gestão do Estado com ênfase na transformação digital dos serviços públicos. Parte relevante dessa iniciativa, portanto, está relacionada com a digitalização de serviços oferecidos à população. Sobre o tema, verificou-se no início do mês de abril que 3.650 (74%) dos 4.909 serviços públicos catalogados pelo portal gov.br estavam disponíveis de forma digital.
Ademais, o avanço na transformação digital do Estado passa pela integração de sistemas e pelo compartilhamento de dados, práticas essenciais para a eliminação de etapas desnecessárias ou redundantes na prestação de serviços públicos. Nesse sentido, o citado Acórdão 2.279/2021 sinalizou a necessidade de melhorias na plataforma Conecta Gov.br, que reúne e disponibiliza serviços de uso comum, a exemplo de acesso ao cadastro base do cidadão, validação biométrica, consulta de CEP, CNPJ, situação militar e certidão negativa de débitos e da dívida ativa da União.
Além da plataforma Conecta Gov.br, deve-se mencionar a evolução na iniciativa de implantação da Identidade Civil Nacional (ICN), que busca integrar a base de dados da Justiça Eleitoral, já dotada de atributos biométricos, às bases de dados identificadoras de pessoas naturais, como o CPF e o registro civil.
Em contrapartida, ainda que o governo federal tenha evoluído no campo da oferta de serviços digitais, os desafios do país nesse âmbito são mais profundos, em especial na área de telecomunicações.
Programa Conecta Brasil
O programa Conecta Brasil foi planejado para enfrentar o desafio da implantação de serviços de telecomunicações em regiões remotas, diante de um país de grandezas continentais e de alta concentração populacional e tem como objetivo “promover o acesso universal e ampliar a qualidade dos serviços de comunicações do país”, e como meta “ampliar o acesso à internet em banda larga para os domicílios brasileiros de 74,68% para 91%”, até 2023.
De início, não foi possível apurar a evolução no índice de acesso domiciliar em banda larga, no período, pela não realização do levantamento específico (Pnad-TIC) por parte do IBGE, em 2020 e pela indisponibilidade, até o momento, dos dados relativos à pesquisa efetuada em 2021.
O Brasil continua apresentando indicadores de velocidade em dispositivos móveis bem abaixo dos padrões mundiais e do mínimo esperado para a conexão de qualidade. Dados de fevereiro de 2022 apontam o país na 78ª posição, entre 138 países, com desempenho sofrível da ordem de 23 Mbps para download e 8 Mbps para upload.
Além disso, há poucas perspectivas concretas para melhoria a curto e médio prazo. O Brasil aparecia, em 2021, como o mais atrasado adotante da tecnologia 5G entre 112 países. Nesse sentido, basta lembrar que, mesmo se cumpridos os compromissos constantes do referido edital para implantação em capitais de estados e do Distrito Federal, primeiro grupo de cidades a ser atendidas, estudos realizados pela área técnica do TCU demonstraram que o Plano Piloto, área central de Brasília, só receberia estações de transmissão suficientes para cobertura integral com o sinal 5G, em dezembro de 2023.
Tais deficiências na infraestrutura de telecomunicações podem comprometer o desenvolvimento sistêmico e sustentável do Brasil, em especial para os eixos “economia baseada em dados” e “novos modelos de negócio”, fortemente dependentes do trânsito massivo de informações digitais e da aplicação de tecnologias, como o blockchain e a inteligência artificial (Acórdãos 1.613/2020 e 1.139/2022, ambos do Plenário), e de outras emergentes.
Por fim, ainda que o programa Conecta Brasil tenha como foco exclusivo a ampliação do acesso em banda larga residencial, é oportuno ressaltar as deficiências estruturais na conectividade das escolas públicas de nosso país, requisito básico para a educação compatível com a era digital.
A pesquisa TIC Educação 2020 revelou que 18% das escolas ainda não tinham acesso à internet, e, na zona rural, esse número atinge 48%. Ademais, a análise deste Tribunal sobre o Programa de Inovação Educação Conectada mostrou que a mediana da velocidade de download nas escolas fica abaixo de 20 Mbps, insuficiente para o bom uso pedagógico da tecnologia. Também se apurou que a maioria das escolas públicas de educação básica apresentam indicadores baixos de formação de professores nessa área (Acórdão 326/2022-TCU-Plenário, relator ministro Augusto Nardes).
Em suma, o panorama em exame sugere que o governo federal dispensa atenção quase exclusiva à transformação digital da máquina estatal, sem dúvida, essencial no esforço de melhoria dos serviços públicos e de desburocratização. Por outro lado, a evolução digital do restante do país parece andar aos soluços, quando se avalia o andamento das iniciativas previstas na estratégia e-Digital, especialmente no que se refere às ações relacionadas aos eixos habilitadores.
Resultados e conclusões
Apesar de os indicadores ainda apresentarem falhas, pode-se afirmar que a disponibilização do serviço público, ou parte dele, de forma remota melhora a experiência do usuário, pois evita idas desnecessárias ao guichê e, em geral, resulta em menor tempo de espera. Segundo o “Painel de Raio-X da Administração Pública Federal”, publicado pelo Ministério da Economia (https://raiox.economia.gov.br), o avanço dos serviços digitalizados teria permitido a economia anual de R$ 1,1 bilhão para o governo e de R$ 3,4 bilhões para a sociedade.
Por outro lado, há necessidade de mudanças urgentes no direcionamento das ações governamentais, de modo a privilegiar, igualmente, as dimensões de prestação de serviços digitais, a melhoria da infraestrutura nacional de telecomunicações e a capacitação da população, a fim de que seja possível ampliar os benefícios da transformação digital para além das fronteiras das repartições públicas.