RELATÓRIO DE FISCALIZAÇÕES EM POLÍTICAS E PROGRAMAS DE GOVERNO

O Tribunal de Contas da União (TCU) elabora, pela 3ª vez, o Relatório de Fiscalizações em Políticas e Programas de Governo (RePP). Trata-se de documento desenvolvido em atendimento ao art. 124 da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2019, que assim determina:

O Tribunal de Contas da União enviará à Comissão Mista a que se refere o § 1º do art. 166 da Constituição Federal, até trinta dias após o encaminhamento da proposta orçamentária de 2019, quadro-resumo relativo à qualidade da implementação e ao alcance de metas e objetivos dos programas e ações governamentais objeto de auditorias operacionais realizadas, para subsidiar a discussão do Projeto de Lei Orçamentária de 2019.

O presente relatório apresenta fichas-síntese e quadro-resumo das principais fiscalizações realizadas pelo TCU em políticas públicas e programas de governo, entre 2017 e 2019. Também consta deste documento o resultado de monitoramento realizado em deliberações proferidas nos Acórdãos 2.127/2017-TCU-Plenário e 2.608/2018-TCU-Plenário (Repp 2017 e 2018, respectivamente).

Componentes da análise

Fiscalizações em políticas sociais

  • Política nacional de formação dos profissionais da educação básica (ac. 591/2019-TCU-Plenário)
  • Política nacional para prevenção e controle do câncer (ac. 1.944/2019-TCU-Plenário)
  • Gestão patrimonial e orçamentária dos museus federais (ac. 1.243/2019-TCU-Plenário)
  • Políticas públicas para convivência com o semiárido (ac. 1.846/2019-TCU-Plenário)
  • Políticas educacionais de desporto (ac. 2.033/2019-TCU-Plenário)
  • Política nacional de enfrentamento à violência contra as mulheres (ac. 1.449/2019-TCU-Plenário)
  • Políticas federais para a faixa de fronteira (ac. 2.252/2015, 1.995/2016 e 2.241/2019-TCU-Plenário)

Fiscalizações em políticas de infraestrutura

  • Políticas públicas de inserção de fontes renováveis na matriz elétrica brasileira (ac. 1.530/2019-TCU-Plenário)
  • Política nacional de transportes (ac. 1.383/2019-TCU-Plenário)
  • Políticas para as cidades: desenvolvimento urbano, habitação, saneamento, mobilidade, gestão de riscos e desastres (ac. 2.153/2018-TCU-Plenário)
  • Obras públicas (ac. 1.079/2019-TCU-Plenário)

Fiscalizações em políticas agroambientais

  • Políticas públicas de licenciamento ambiental (ac. 1.789/2019-TCU-Plenário)
  • Declaração de aptidão ao Pronaf (ac. 1.197/2018-TCU-Plenário)
  • Desenvolvimento Sustentável - Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas – ONU (ac. 709/2018-TCU-Plenário)

Fiscalizações em políticas de ciência e tecnologia

  • Políticas federais de fomento à inovação no setor produtivo (ac. 1.237/2019-TCU-Plenário)
  • Uso integrado de dados em políticas públicas (ac. 2.587/2018-TCU-Plenário)
  • Programa de informatização das unidades básicas de saúde (ac. 1.961/2018-TCU-Plenário)

Achados

No que concerne à capacidade de governança das políticas públicas, das dezessete políticas analisadas:

  • 65% apresentavam falhas na institucionalização ou regulamentação;
  • 59%, inadequações na gestão de recursos (financeiros e humanos);
  • 59%, falhas no monitoramento e avaliação;
  • 53%, falhas no planejamento;
  • 47%, falhas na coordenação;
  • 41%, falhas na gestão de riscos;
  • 24%, falhas na accountability.

53% das políticas apresentavam falhas no planejamento

As ações de controle realizadas pelo TCU entre 2017 e 2019 apontam que a adoção de boas práticas de formulação de políticas públicas, com análise ex ante e planejamento, ainda não são uma realidade universal.

No RePP 2018 (Acórdão 2.608/2018-TCU-Plenário), o TCU apontou que 31% das políticas públicas avaliadas naquela ocasião encontravam-se em nível inicial de maturidade de “planejamento” e, mais severamente, 50% delas estavam em nível inicial de capacidade na dimensão “objetivos”.

Em 2019, foi possível identificar a ocorrência de falhas no planejamento de 53% (9 de 17) das políticas públicas analisadas. Falhas essas que vão desde a falta de visão de longo prazo e de diretrizes, até fragilidades na lógica de intervenção e execução da política sem amparo em planos que definam precisamente os objetivos, as metas e os resultados esperados.

65% das políticas apresentavam falhas em sua institucionalização ou regulamentação

O RePP 2018 indicou que em 21% das políticas que foram objeto de análise o normativo utilizado para institucionalização não possuía legitimidade e competência para normatizar a atuação dos diversos órgãos, instituições e esferas de governo envolvidos. O estudo mostrou ainda que 53% das políticas encontravam-se em estado inicial ou intermediário de institucionalização.

Em 2019, a questão outra vez se fez presente: identificou-se a ocorrência de falhas na institucionalização ou regulamentação de 65% das políticas públicas analisadas.

Outrossim, não foi possível identificar na legislação vigente, conceituação, categorização e descrição precisas dos principais tipos de políticas públicas, tão pouco indicação clara das instâncias responsáveis e dos instrumentos por meio dos quais aquelas devem ser institucionalizadas, formalizadas e regulamentadas.

47% das políticas apresentavam falhas na coordenação

Foram identificadas falhas recorrentes na coordenação de políticas públicas nas ações de controle realizadas pelo TCU ao longo dos últimos três anos, falhas essas que se manifestam em políticas de nível global (ex. Objetivos do Desenvolvimento Sustentável - ODS), nacional (ex. matriz elétrica), regional (ex. fronteiras, semiárido) e sub-nacional (ex. educação básica).

Das dezessete políticas públicas selecionadas para compor o RePP/2019, oito (47%) apresentaram falhas de coordenação que variam desde a inexistência de estrutura atuante até a ausência de integração com outras políticas.

59% das políticas apresentavam inadequações na gestão de recursos (financeiros e humanos)

Foi possível evidenciar a ocorrência de inadequações na gestão de recursos (financeiros e humanos) em 59% (10 de 17) das políticas públicas analisadas, ocorrências essas, em sua maioria, relacionadas a problemas na gestão orçamentária e financeira e na gestão e fiscalização de contratos:

  • Quanto à gestão orçamentária e financeira, foram identificados problemas como: assunção de compromissos acima da capacidade de financiamento; interrupção do fluxo orçamentário; não recebimento tempestivo de contrapartida dos entes que recebem recursos federais; insuficiência de recursos; e falta de regionalização do gasto.
  • Quanto à gestão e fiscalização de contratos, foram identificados: atrasos na elaboração de termos de referência; falhas nos projetos; indícios de irregularidades nos Acordos de Nível de Serviço (ANS); falta de capacidade para fiscalizar os contratos e de atestar o volume de informações; enfim, assunção de compromissos acima da capacidade administrativa dos órgãos.

41% das políticas apresentavam falhas na gestão de riscos

Com relação ao monitoramento, à avaliação e à gestão de riscos, o Acórdão 2.127/2017-TCU-Plenário já sinalizava acerca da ineficiência dos mecanismos existentes, o que dificulta o acompanhamento e a aferição de resultados e pode impedir o alcance dos objetivos almejados.

Em 2019, a situação encontrada foi semelhante: 41% (7 de 17) das políticas públicas analisadas apresentavam falhas na gestão de riscos ou em controles internos, tais como: inexistência de sistema de gestão de riscos capaz de identificar e gerenciar eventos que afetem os objetivos das ações governamentais e deficiências nos controles internos para operacionalização das transferências intergovernamentais.

59% das políticas apresentavam falhas no monitoramento e avaliação

Nos Relatórios de 2017 e 2018, o Tribunal alertou acerca da existência de deficiências no monitoramento e avaliação governamental. Tais deficiências ainda persistem, já que, em 2019, observando-se a situação das políticas públicas em estudo, constatou-se que 59% delas apresentam falhas no monitoramento e avaliação, muitas das quais decorrentes da falta de um modelo de monitoramento e avaliação, da insuficiência de dados e de sua baixa qualidade.

O trabalho também demonstrou que a atuação do legislativo, no sentido de deixar claros os instrumentos de institucionalização e o conteúdo destes, pode contribuir para o aprimoramento da capacidade de governança de políticas e programas.

24% das políticas apresentavam falhas na accountability

No que tange à transparência e à accountability, observa-se que, especificamente quanto aos dados gerais para o acompanhamento de programas, ações, projetos e obras de órgãos e entidades, o art. 8º da Lei 12.527/2011 é explícito ao indicar que “é dever dos órgãos e entidades públicas promover, independentemente de requerimentos, a divulgação em local de fácil acesso, no âmbito de suas competências, de informações de interesse coletivo ou geral por eles produzidas ou custodiadas”. A despeito desse preceito legal, 24% (4 de 17) das políticas públicas analisadas apresentam falhas na accountability no que tange à transparência.

Informações acerca da implementação, acompanhamento e resultados das políticas públicas

Evidenciou-se a insuficiência de informações transparentes acerca das políticas públicas vigentes e de seus respectivos objetivos, indicadores, metas e desempenho físico-financeiro. Entre os achados das auditorias realizadas encontram-se, por exemplo: a execução da políticas sem amparo em planos estratégicos que definam os objetivos, as metas, os resultados esperados e a visão de longo prazo; a inexistência de indicadores de resultado e impacto para parte das políticas; a falta de informações para apoiar a realização de monitoramento e avaliação; a ausência de integração entre as diferentes bases de dados governamentais, o que resulta em expressivo quantitativo de divergências de informações e possibilita a existência de inconsistências; e a utilização de mecanismos para promover a comunicação e a prestação de contas da execução das políticas aplicadas que não asseguram a transparência necessária.

Trata-se de falha relevante de transparência e accountability que preterem o Congresso Nacional e a sociedade de seu papel de fiscalização e controle do gasto público e vão de encontro ao definido na Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011), que assim preconiza: (a) cabe aos órgãos e entidades do poder público assegurar a gestão transparente da informação, propiciando amplo acesso a ela e sua divulgação (art. 6º, inciso I); (b) o acesso à informação compreende o direito de obter informação relativa à implementação, acompanhamento e resultados dos programas, projetos e ações dos órgãos e entidades públicas, bem como metas e indicadores propostos (art. 7º, inciso VII, alínea a); (c) é dever dos órgãos e entidades públicas promover, independentemente de requerimentos, a divulgação em local de fácil acesso, no âmbito de suas competências, de informações de interesse coletivo ou geral por eles produzidas ou custodiadas, divulgação que deve conter, entre outras coisas, dados gerais para o acompanhamento de programas, ações, projetos e obras de órgãos e entidades (art. 8º, inciso V).

Embora a Lei de Acesso à Informação esteja em vigor desde 2011, ainda não é possível identificar informações acerca da “implementação, acompanhamento e resultados dos programas, projetos e ações dos órgãos e entidades públicas, bem como metas e indicadores propostos” de uma forma completa e estruturada.

Por fim, não foi identificado no rol de sistemas estruturantes do governo federal, sistema que abrangesse todo o ciclo de políticas públicas. Também não foi identificada solução sistêmica que abarcasse o conjunto de políticas públicas vigentes que não estão explícitas no PPA, como por exemplo as políticas e os planos nacionais, regionais, transversais e setoriais; as políticas que não envolvem diretamente os créditos orçamentários (por exemplo, políticas baseadas em renúncias de receitas e políticas de regulamentação); e os ditos “programas fantasia”. Para essas políticas não há dados estruturados em sistema ou plataforma aberta, o que compromete a transparência e accountability pública.

Assim, diante da necessidade de se garantir transparência às informações e à condução das políticas públicas, entende-se que o controle externo pode induzir a melhoria da qualidade dos dados sobre políticas públicas em diálogo com os órgãos competentes do Poder Executivo.

Monitoramento dos Acórdãos 2.127/2017 e 2.608/2018-TCU-Plenário

Ao longo do monitoramento dos Acórdãos 2.127/2017 e 2.608/2018-TCU-Plenário, verificou-se que foram promovidos avanços importantes quanto às recomendações dos Relatórios de Políticas e Programas Públicos de 2017 e 2018, principalmente quanto à sistematização do monitoramento e da avaliação das políticas públicas, criando instâncias e elaborando referenciais que subsidiem órgãos e agentes a realizarem avaliações de programas e políticas públicas. Há ainda um esforço de incentivar uso do Guia de Avaliação Ex Ante na formulação dos programas, como previsto no Manual Técnico do Plano Plurianual do Governo Federal.

Algumas das medidas que vinham sendo implementadas nos exercícios anteriores permaneceram sem avanços significativos, como a positivação do plano nacional integrado de longo prazo, uma vez que o Projeto de Lei 9.613/2017 permanece sem perspectivas de ser aprovado no curto prazo. O governo federal também não informou novas medidas voltadas para: o fortalecimento, a avaliação e o aprimoramento contínuo da governança das organizações públicas; o aperfeiçoamento do processo de instituição de políticas públicas; e o aprimoramento da coerência e da coordenação. Tampouco foram apresentadas medidas no sentido de atualização da normatização do Sistema de Controle Interno do Poder Executivo Federal.

Cabe registrar ainda o retrocesso em relação a algumas propostas dos RePP 2017 e 2018. O Poder Executivo havia indicado, no primeiro monitoramento, ações que tinham o condão de aperfeiçoar o uso de indicadores no monitoramento e na avaliação das políticas públicas, informando que implementaria indicadores de efetividade para a dimensão estratégica do PPA e que buscava desenvolver um sistema de indicadores-chave nacionais. No entanto, no monitoramento identificou-se que não houve nenhum avanço na implementação do sistema de indicadores-chave.

Apesar do avanço significativo em algumas áreas, o que se verifica é que ainda há espaço para melhoria da atuação do Centro de Governo com vistas a incentivar a Administração Pública a aperfeiçoar sua atuação em áreas essenciais. Diante disso, faz-se necessário permanente esforço do governo federal para que os problemas sistêmicos identificados nas políticas públicas, conforme detalhado nos Acórdãos 2.127/2017-TCU-Plenário e 2.608/2018-TCU-Plenário, sejam corrigidos.

Processo: TC 020.750/2019-6

Relator: Ministro Vital do Rêgo

Acórdão: 2513/2019-PL

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